A pior herança que um ditador deixa é o prolongamento da ditadura personificou.
Erradamente, costumamos pensar que o afastamento de um ditador termina com o regime, mas não é verdade. Mesmo quando o criador do monstro parte (quase sempre por morte), a criatura abjeta continua. Duas razões fundamentais contribuem para isto: todos aqueles que beneficiaram com o poder ditatorial querem manter os iníquos privilégios que possuem e tudo farão para que o status quo se mantenham; a maioria da população já está tão domesticada que já perdeu a memória do que é viver em liberdade.
Olhemos alguns exemplos: a Rússia passou da ditadura dos czares para a do Partido Comunista, sem pestanejar. Aguentou estoicamente décadas até que Ieltsin subiu ao poder, mas logo Putin recuperou, na prática, os métodos nada democráticos do KGB. Se os russos, vivessem em democracia estranhariam bastante e seria normal que cometessem erros crassos.
Em África, a maioria dos povos vive debaixo de ditaduras há séculos. Primeiro os povos foram mantidos em ignorância e cativeiro pelos colonizadores europeus, depois foram subjugados por líderes tribais ou de influência marxista, que aplicaram a mesma receita de governo que tanto criticaram.
A oriente, a grande China passou do poder absoluto das monarquias dinásticas para o poder absoluto do Partido Comunista, sem nunca o povo ter sido realmente chamado a decidir o seu futuro.
Os países árabes vivem há décadas submetidos à ditadura do Islão, que torna o poder inacessível à esmagadora maioria da população.
Na União Europeia, o poder do dinheiro quis impor os seus governos de tecnocratas aos gregos e aos italianos. Felizmente não conseguiram, mas cortaram-lhe a ração.
Na verdade, esta coisa da democracia parece um conto de fadas para a maioria da população mundial. E quem a perde demora largas décadas a recuperá-la, porque o poder absoluto reduz o ser humano à mentalidade da selva.
A resistência dos gregos e dos italianos apenas vem provar que um povo sem cultura dificilmente consegue viver em liberdade e democracia. Adianta pouco ser rico, poderoso ou grande – quando o espírito é pobre somos sempre cativos.
Gabriel Vilas Boas