MORRER COM DIGNIDADE É BEM MAIS QUE A EUTANÁSIA


O tema da eutanásia nunca será um tema de consensos, nem de política, nem de ideologia, mas também não é um assunto que possamos varrer para debaixo do tapete. Não sendo uma urgência, deve ser discutido pela sociedade portuguesa, que neste assunto deve ser ajudada tecnicamente por médicos e juristas. Os políticos devem estar calados, porque este não é um assunto “político”.
O tema ganha relevância, porque a população vive cada vez mais tempo e os anos da velhice são penosos e longos, nalguns casos insuportáveis, por causa de patologias incuráveis.

Certos casos há (não tantos assim) em que, para a pessoa em sofrimento, para a família, para o corpo clínico, a solução da eutanásia é a melhor, mas a legislação não a permite. Subsistem duas soluções: providenciar uma morte assistida oficiosa ou aguentar estoicamente uma dor inútil até que a natureza se encarregue de lhe pôr fim. Nenhuma destas soluções permite “acabar” com dignidade. 

Viver com dignidade, morrer com dignidade! Acho que devemos abordar a questão sob este prisma.
Afirmar uma cultura de Vida é bem mais que impedir a legalização da eutanásia, em determinadas ocasiões.
Se não tivermos medo das palavras, verificamos que a eutanásia já se pratica de modo informal em muitos hospitais portugueses. Quantos de nós já não assistiram, em hospitais, a gente que foi deixada morrer, porque os médicos «já não tinham mais que lhe fazer»? O que significa “de comum acordo com a família, as máquinas foram desligadas»? O que acham que quer dizer «A família e os médicos decidiram parar com os tratamentos agressivos…»?

Com lei ou sem ela, a verdade é que aqueles que querem morrer, porque já não suportam mais a dor das maleitas do corpo, fazem a morte acontecer.
Para mim, o direito a morrer com dignidade começa no direito a viver com dignidade e isso significa dispor de uma assistência médica e social eficiente, humanizada e acompanhada. Os hospitais tem de ter espaço, pessoal e tempo para atender os velhos com dignidade. Não podem apressar a sua morte, porque são pobres ou precisam das camas para outros doentes ou simplesmente porque acham que já viveram o suficiente.
Viver com dignidade é formar uma rede consistente de hospitais públicos de cuidados continuados, onde todos aqueles que sofrem possam encontrar o amparo físico, médico e psicológico que merecem.

A cultura da vida não se resume à decisão sobre o momento da morte.

Gabriel Vilas Boas